Há 22 anos, em 2 de agosto de 2002, era lançado mundialmente o álbum de estreia do Shaman . “ Ritual ” já havia saído no Japão em 21 de jun...
Há 22 anos, em 2 de agosto de 2002, era lançado mundialmente o álbum de estreia do Shaman. “Ritual” já havia saído no Japão em 21 de junho daquele mesmo ano, e ainda que a própria banda tenha optado por comemorar naquela data, nós optamos em celebrar o disco neste segundo dia de agosto, em que os demais países tiveram acesso a essa obra prima, que é assunto nesta sexta-feira.
Antes de falarmos deste disco em si, precisamos voltar um pouco no tempo, mais precisamente cinco anos antes: em 1997, logo após o término da turnê do álbum “Holy Land”, Andre Matos já não sentia o desejo de continuar no Angra. Chegou a sair da banda, mas foi convencido a retornar, gravando o álbum “Fireworks“. Mas o caldo entornou quando o baterista Luis Mariutti e o baterista Ricardo Confessori ficaram insatisfeitos com os rumos que o empresário do Angra estava dando à banda e os três resolveram pular fora para montar um novo projeto. Recrutaram o guitarrista Hugo, irmão de Luis e o Shaman estava formado. O nome da banda, é uma referência a uma das faixas do álbum “Holy Land”, “The Shaman“. O quarteto iniciou o processo de composição e lançaram uma demo em 2001, contendo 4 músicas, das quais, 3 estariam presentes no aniversariante de hoje: “Time Will Come”, “For Tomorrow” e “Blind Spell”, além de uma faixa chamada “Be Free“.
Entretanto, antes de todos iniciarem os trabalhos de composição do aniversariante do dia, Andre Matos se dedicou a um projeto pouco divulgado, onde trabalhou com seu amigo Sascha Paeth. Tendo o Queen como principal referência musical, a dupla viaja por inúmeras influências musicais neste que é considerado por muitos fãs do maestro como a maior obra dele.
“Ritual” é um álbum conceitual que trata de diversas culturas indígenas, sobretudo o xamanismo e musicalmente traz alguma semelhança com o que o próprio trio apresentou com “Holy Land”, pela mistura de ritmos e utilização de instrumentos incomuns para uma banda de Heavy Metal. Aliás, esse era o diferencial destes caras, pois não tinham apenas a intenção de fazer algo que já era produzido no velho mundo e sim mesclar os ritmos fazendo com que todos ficassem boquiabertos com a capacidade que nós brasileiros temos em dar a nossa cara ao Metal. Isso é impressionante.
O álbum foi quase que inteiramente gravado na Alemanha, à exceção das partes de percussão, gravadas no Brasil. A produção foi do parceiro de longa data de Matos, o alemão Sascha Paeth, com quem o vocalista tinha gravado o projeto Virgo, voltado ao Hard Rock. Vamos então destrinchar cada uma das dez faixas deste disco.
O começo se dá com a intro bem longa chamada “Ancient Winds”, executada por Miro Rosenberg, tecladista alemão com trabalhos no Avantasia, Virgo, Edguy, Kamelot, Angra, Luca Turilli, entre tantos outros. Aqui temos um clima de paz e tranquilidade nos arranjos da música que mescla batidas indígenas, flautas e teclados.
Após três minutos, o que realmente nos interessa, começa para valer e a primeira música do trio recém saído do Angra mostra que os caras vieram para arrebentar tudo. E esse é o recado da música “Here I am“, um Power Metal arrebatador, cheio de melodias. “Distant Thunder” é a faixa a seguir e é um dos destaques do álbum, uma música que viaja pelo Progressivo e tudo aqui é perfeitamente calculado: melodias, timbres dos instrumentos e a voz inconfundível de Andre Matos.
“For Tomorrow” é outra faixa que se destaca e aqui temos uma influência da Word Music em uma música que vai se tornando interessante a medida que se desenvolve, com o guitarrista Hugo Mariutti é a estrela com ótimos riffs e impondo certo peso. Excelente. “Time Will Come” é a faixa número cinco e o belo piano de Andre Matos em sua intro é só uma enganação para quem pensa que a música se desenvolverá como uma balada: logo logo ela vira um Prog/Power da melhor qualidade, mostrando que naquele momento o trio estava no auge da forma e que ainda que o Angra recrutasse ótimos músicos para substituí-los, era uma perda inestimável. Certamente esta faixa está entre as minhas favoritas não só da carreira do Shaman, mas do Heavy Metal brasileiro. Destaco o bumbo duplo de Ricardo Confessori.
“Over Your Head” aposta no Prog Metal com um ótimo clima e conta com a participação do tecladista Derek Sherinian, abrilhantando ainda mais a música. Aqui Confessori se destaca novamente com suas batidas e o bumbo duplo falando bem no refrão. Agora é a vez da balada “Fairy Tale”, que fez a banda ficar conhecida em praticamente todo o território nacional pela grande massa. E isso se deu por conta da inclusão desta faixa na novela O Beijo do Vampiro, da TV Globo. Era a primeira vez que uma banda de Heavy Metal nacional figurava em uma trilha sonora das novelas da maior rede de televisão que temos no Brasil. Isso não é um feito a ser desmerecido. A música é cheia de melodias e o destaque é a performance vocal de Andre Matos. De pensar que essa música foi apresentada aos membros do Angra e os membros vetaram. Hoje em dia, os headbangers conservadores (duas palavras que não combinam na mesma frase, mas os brasileiros insistem nisso) cancelariam a banda por emplacar uma música na “globolixo”, alcunha tão ridícula quanto a militância deles por um ex-presidente mancomunado com milicianos e por quem aguardamos a condenação por todos os crimes por ele cometidos.
“Blind Spell” é uma faixa mais Hard Rock em que os bons riffs de guitarra vão conduzindo a música. A faixa título traz a banda de volta ao Prog, uma música bem agradável de se ouvir e que Hugo Mariutti deu conta do recado mais uma vez com bons riffs.A faixa final, “Pride“, é carregada de uma energia cavalar. É rápida e pesada, e deixa aquele gostinho de quero mais.
Enfim, em quase uma hora de disco que passa tão rápido que nem percebemos. “Ritual” mostrava que os caras estavam bem resolvidos e que a mudança de ares só os fez bem, marcando a estreia com o pé direito de mais uma banda no cenário Metal do nosso Brasil. Um senhor disco, com certeza absoluta, o melhor lançado naquele já longínquo ano de 2002.
“Ritual” vendeu mais de 500 mil cópias e proporcionou uma turnê longa que durou quase dois anos e só deu ainda mais visibilidade para a banda. Deixa também um legado sem tamanho para o Heavy Metal tupiniquim e está marcado como um dos mais importantes da história do estilo. Merece toda aclamação possível.
Um álbum que envelhece bem, mas infelizmente a banda envelheceu mal e terminou da pior forma possível, após o baterista redpill e bolsonarista fanático (soa até como um pleonasmo, já que todo eleitor do dito cujo é fanático, até doaram 17 milhões via pix para o cidadão como se ele estivesse merecendo/ precisando), que destilou ódio e preconceito nas redes sociais e o último show da banda, na primeira edição do Summer Breeze Brasil, no ano passado, embora tenha sido uma épica homenagem a Andre Matos, foi de um improviso que beirou o anti-profissionalismo. Mas nada tira o brilho deste álbum que merece ser celebrado e figura fácil como um dos dez melhores do Heavy Metal brasileiro de todos os tempos.
Participações especiais:
Fonte Confere Rock